quinta-feira, 14 de abril de 2011

A milionária disputa judicial pelas patentes


A Justiça tornou-se um dos últimos recursos dos grandes laboratórios para manter a exclusividade das vendas de seus medicamentos protegidos por patentes. Segundos dados do Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI), referentes a fevereiro, há 39 ações em instância superior - Superior Tribunal de Justiça e algumas no Supremo Tribunal Federal - envolvendo patentes de medicamentos. E a briga se justifica pelos milhões de reais em receita que cada mês a mais de proteção garante a essas empresas.


Quando um medicamento inovador tem sua patente expirada, somente no primeiro ano a empresa que o desenvolveu perde cerca de 60% das vendas do produto, segundo dados da Pró-Genéricos (Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos). Passado esse primeiro ano, as perdas continuam e os medicamentos de referência acabam mantendo apenas cerca de 15% de suas vendas anteriores ao fim da proteção, diante da pressão dos preços mais baixos dos genéricos. Em termos absolutos, essa matemática fica ainda mais forte: a Pró-Genéricos calcula que, em 2009 e 2010, o mercado de inovação perdeu US$ 1 bilhão com o fim das patentes dos produtos mais vendidos, os chamados blockbusters.

O Viagra é o clássico exemplo. Em 2009, as vendas no Brasil da pílula para disfunção erétil, enquanto estava protegida pela lei, gerou para a Pfizer cerca de R$ 200 milhões, com um volume de 6,9 milhões de unidades comercializadas. Logo após o fim da patente no primeiro semestre do ano passado, a empresa passou a concorrer com os genéricos e logo lançou o desconto de 50% por comprimido (ficando R$ 15 cada). Mesmo com a estratégia ajudando no volume, o faturamento da Pfizer com o Viagra caiu para cerca de R$ 160 milhões em 2010.

Valores tão envolventes explicam o recente caso do também blockbuster Crestor, da AstraZeneca. O medicamento para o tratamento de colesterol já está sendo ameaçado pela entrada de genéricos no mercado. Para proteger sua inovação, a empresa entrou na Justiça contra a Germed Pharma, pedindo a revogação do registro sanitário concedido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a fabricação do genérico rosuvastatina cálcica (substância utilizada no Crestor).

A AstraZeneca alega que a autorização fere seu direito de propriedade industrial, enquanto a Germed argumenta que a multinacional não protegeu a molécula, apenas a fórmula, e a formulação do genérico não é a mesma. No mês passado, a Justiça do Distrito Federal negou o pedido da AstraZeneca. A briga não é à toa: o mercado da rosuvastatina no Brasil atinge o patamar de R$ 200 milhões a R$ 250 milhões por ano. Um mês que a empresa ganha de proteção gera, portanto, uma média de R$ 19 milhões.

Além da questão financeira, manter o produto protegido pela patente é também uma forma de a indústria farmacêutica tentar compensar as dificuldades de continuar crescendo. Muito dependente de inovação, o mercado brasileiro amadureceu, deixando menos espaço para novos medicamentos. As pressões vêm ainda da forte competição e dos altos custos de pesquisa. "A ciência já obteve produtos de grande eficácia para as patologias mais prevalentes. Os ganhos nestas áreas (de inovação) requerem muito investimento para pequenos incrementos, fazendo com que os desembolsos não sejam tão atrativos como foram no passado", afirma o diretor do IMS Health, Marcello Albuquerque.

Esse cenário tem feito com que os grandes do setor se agarrem nos bons rendimentos gerados por suas inovações. "Agora chegamos a um grau de amadurecimento do setor, que não há muito o que inventar, que venda em altos volumes. (As empresas) não estão conseguindo colocar produtos novos na mesma velocidade em que se perdem as patentes", completa a diretora de novos negócios da Eurofarma, Maria Del Pilar Muñoz.

Por outro lado, as gordas cifras geradas pelos medicamentos inovadores é o que sustenta a indústria dos genéricos. De olho no fim das patentes, o vice-presidente de marketing da EMS calcula que possa ser injetado no mercado de genéricos brasileiro cerca de R$ 500 milhões só com as proteções dos blockbusters que vão expirar em 2011. "Estamos com foco em cinco grandes produtos", afirma. Do mesmo modo, a Eurofarma tem no radar 26 moléculas. "Para as quais já estamos trabalhando em 75%", afirma Muñoz.

"O jogo do mercado é esse. Ganha-se primeiro, depois o mercado se abre. É o ciclo de vida dos produtos", constata o diretor de planejamento de negócios da Pfizer, Gustavo Petito. Para se defender da concorrência e da perda das patentes, a empresa entrou no ano passado no mercado de genéricos brasileiro por meio de uma parceria com a Eurofarma e da aquisição de uma parte do Teuto. Hoje tem internacionalmente cerca de 20 medicamentos protegidos por patentes.