segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O desafio do fim de ano da EMS


Toda segunda-feira, os executivos da farmacêutica EMS chegam ao escritório em Hortolândia, a 115 quilômetros de São Paulo, em estado de especial ansiedade. É nesse dia que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) costuma divulgar a lista de medicamentos genéricos cujos registros foram aprovados - e que podem, a partir daí, ser vendidos. A empresa tem, hoje, cinco drogas aguardando aprovação e espera pelo menos duas liberações até o fim do ano.

Esses lançamentos são importantes para ajudar o laboratório a alcançar uma meta ambiciosa: fechar o último mês de 2010 como líder em genéricos no País, posição hoje ocupada pela Medley (no ranking geral, incluindo medicamentos com marca, a EMS já é a primeira). "Esperamos uma arrancada nas próximas semanas", diz Waldir Eschberger, vice-presidente de mercado da EMS. "A hora que a gente conseguir, não perde mais a posição de primeiro. Queremos que 2011 seja nosso primeiro ano na liderança em genéricos."

Em 2010, a EMS tem se mostrado como a mais combativa entre os fabricantes de genéricos. Desde janeiro, a empresa cresceu 37% - mais que sua própria previsão, de 30%. A fábrica trabalhou 24 horas por dia, assim como o corpo de cientistas, dividido em três turnos. E, na expressão máxima de sua agressividade, a empresa foi a primeira a colocar no mercado as cópias das duas principais drogas cujas patentes expiraram em 2010: o Viagra, para disfunção erétil, e o Lípitor, para controle do colesterol. Juntos, os genéricos desses medicamentos devem movimentar um mercado de quase US$ 300 milhões daqui a um ano, segundo a Pró Genéricos. E, na lógica desse mercado, chegar antes significa, fatalmente, tornar-se líder.

Máquina. Por trás dos resultados, está uma sofisticada máquina de lançamento de genéricos. Com 200 especialistas, a EMS tem o maior centro de desenvolvimento de medicamentos do País, que começa a desenhar a cópia de uma droga quatro anos antes do fim de sua patente. A área de marcas e patentes trabalha com antecedência semelhante. Os executivos da EMS acompanham, hoje, cerca de 200 processos judiciais que discutem o período de validade de patentes.

É comum que as farmacêuticas que criam as drogas peçam, na Justiça, a extensão de prazos. Como os casos podem tramitar durante anos, a EMS fica atenta para não perder a chance de sair no mercado antes dos concorrentes - e também para não gastar tempo com drogas que não poderão ser lançadas no curto prazo.

Um caso recente mostra a agressividade da EMS nesse processo. Em agosto, a farmacêutica envolveu-se em uma disputa jurídica para lançar sua cópia do Lípitor, medicamento da Pfizer que é o mais vendido do mundo. A primeira patente do produto foi depositada nos EUA em 1989. Como sua validade é de 20 anos, a proteção deveria expirar em 2009. A Pfizer conseguiu uma revalidação usando como argumento outra patente depositada mais tarde, estendendo o prazo para dezembro de 2010. A EMS acabou convencendo o Tribunal Regional Federal da 2.ª Região do Rio de que a segunda patente era apenas uma "continuação" da original, derrubando, assim, a restrição. Na mesma semana, o laboratório participou de sua primeira licitação para vender a droga ao governo de Minas Gerais.

Vinte dias depois que a EMS conseguiu a liminar, o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual) venceu uma ação na Justiça que permitiu a fabricação de versões do Lípitor por qualquer laboratório no Brasil. Até agora, porém, apenas a Eurofarma, que tem uma parceria com a própria Pfizer, colocou seu produto no mercado. A pesquisa do Aché, por exemplo, não conseguiu contornar outras patentes relacionadas ao produto.

Competição. As drogas recém-lançadas e as que ainda vão entrar no mercado serão a principal arma da EMS para tentar alcançar a última meta do ano - mas manter a liderança em genéricos não deve ser uma tarefa fácil. A distância entre ela e a Medley no segmento é de US$ 200 milhões no acumulado entre janeiro e setembro. É mais do que a terceira colocada da lista, a Eurofarma, vendeu no mesmo período. Como se não bastasse, a Medley tem intensificado a política de descontos pela qual ficou conhecida no mercado, segundo fontes do setor. "Oito dos dez genéricos mais vendidos no mercado são da Medley. A empresa pretende alavancar sua liderança por meio de um consistente plano de lançamentos e da expansão de sua capacidade produtiva", informou por e-mail a farmacêutica, adquirida em 2009 pela gigante francesa Sanofi-Aventis.

Para qualquer lado que se olhe, há sinais de que a competição no mundo dos genéricos tem se intensificado. Até a americana Pfizer, que passou anos encarando os fabricantes de cópias como inimigos, fez sua primeira aquisição no setor no mês passado, no Brasil.

Com 40% de participação na goiana Teuto, a estratégia da multinacional é "ser um dos grandes". "Não dá para ficar de fora do segmento que mais cresce", diz Gustavo Petito, diretor de planejamento de negócios da Pfizer no Brasil. "Queremos entrar com os genéricos de nossos próprios medicamentos antes dos concorrentes."

Imagem. Além da agressividade, a trajetória recente da EMS foi marcada pelo esforço para mudar a imagem. Em um episódio polêmico ocorrido em 2002, a EMS foi acusada de copiar embalagens de produtos concorrentes de modo a confundir o consumidor. Para encerrar o assunto, no ano passado, ela fez acordos com empresas que a processavam, como Johnson & Johnson, Sanofi, Nycomed e Bayer Schering. A EMS não comenta se houve o pagamento de indenizações. "A empresa procurou os incomodados para esclarecer a situação. Todo mundo se arrepende do que houve. Ninguém ficou confortável", diz Eschberger. Ao mesmo tempo, para impulsionar seus medicamentos de marca, a EMS decidiu se aproximar da comunidade médica, abrindo a fábrica para visitas em 2009. Desde o início do ano, 2,2 mil médicos conheceram a sede.