segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Justiça tende a confirmar o fim das patentes de farmacêuticas


SÃO PAULO - A indústria farmacêutica estima em mais de R$ 1 bilhão o valor de um mercado em disputa nos tribunais brasileiros. A cifra equivale ao que as empresas deixariam de lucrar caso os prazos finais de validade das patentes de diversos medicamentos fossem confirmados pela Justiça e expirassem em 2010, ano de vencimento de vários registros. Mas o desfecho deve ser desfavorável para as grandes empresas multinacionais do setor, que têm contra elas importantes precedentes no Superior Tribunal de Justiça (STJ).



No final de abril, o Tribunal impôs amarga derrota para a Pfizer ao reconhecer que a validade da patente do Viagra terminava em junho deste ano (e não em 2011, como queria a empresa), quando a farmacêutica perderia o direito de exclusividade na fabricação e venda do medicamento. Estima-se que a empresa ganhava R$ 200 milhões por ano só no Brasil com a venda do produto.



O procurador-chefe do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), Mauro Sodré Maia, afirma que existem hoje 37 recursos especiais em trâmite no STJ que tratam de pedido de extensão do prazo das patentes pipelines, criadas com a Lei de Propriedade Industrial em 1996 para proteger invenções farmacêuticas e químicas. O mecanismo previu a revalidação das patentes registradas no exterior.



Segundo Maia, em todo o Judiciário existem cerca de 80 ações pendentes de julgamento -muitas delas potenciais recursos que vão chegar ao STJ no futuro.



O procurador está confiante de que o STJ mantenha o entendimento do caso do Viagra. "A decisão foi de uma sessão do Tribunal [formado por 3ª e 4ª Turmas] e o peso é maior. Isso indica a consolidação de um entendimento de que as extensões da validade das patentes não são devidas", afirma Maia. Ele lembra que a primeira decisão do STJ que negou a extensão do prazo da patente, no caso do hipertensivo Diovan, foi dada no final de 2009 e sinalizou a mudança no Tribunal.



O advogado Alexandre Lessmann Buttazzi, do Peixoto e Cury Advogados, concorda. "É muito provável que o Tribunal siga a mesma linha de entendimento. A forte tendência é que este paradigma seja expandido e torne-se modelo e jurisprudência", afirma.



A busca agora, segundo Mauro Maia, é pela celeridade nos julgamentos. "Estamos tomando medidas para provocar as decisões o mais rápido possível". O INPI está enviando pedidos de preferência para os ministros julgarem as ações. Está em estudo, em conjunto com a Procuradoria Geral Federal, se é oportuno provocar o julgamento dos casos pelo rito dos recursos repetitivos, ou seja, quando a decisão firmada pelo STJ deve ser seguida por todos os tribunais. A demora para o julgamento dos casos, para Maia, adia a entrada do conhecimento em domínio público e impede o ambiente de livre-concorrência. "O genérico não entra no mercado e o preço não diminui. Isso impede o acesso da população e onera políticas de saúde pública".



Na queda-de-braço do INPI com as empresas para extensão do prazo das pipelines há um lado se saindo melhor. Desde 2000 até hoje, existem no Judiciário 111 decisões favoráveis ao instituto e 67 contrárias - a maré começou a mudar em favor do INPI em 2006 e, antes disso, grande parte das decisões judiciais foram favoráveis às multinacionais. No STJ, segundo o INPI, são quatro favoráveis e seis contrárias no total, quadro que agora deve também ser revertido.



O prazo de validade das patentes é o motivo da grande batalha judicial. A legislação garante que as pipelines registradas até um ano depois da nova lei de 1996 valem por 20 anos. Para o INPI e as indústrias nacionais de genéricos, grandes beneficiadas com a negativa de extensão da validade, o prazo inicia-se na data do primeiro registro do remédio no exterior - as demais seriam apenas continuidade da original, o que foi seguido pelo STJ. Já as multinacionais defendem a data mais recente, do último registro. De acordo com o INPI, muitos pedidos de patentes eram depositados pela primeira vez num país e, depois, eram abandonados e seguiam para outro local. O órgão não reconhece válidas as prorrogações por demora ou novidades concedidas no exterior.



O advogado Wilson Pinheiro Jabur, sócio do Salusse Marangoni Advogados, lembra de outro tipo de ações sobre patentes: as que pedem extensão do prazo de 15 anos, concedido antes da Lei de Propriedade Industrial, por mais cinco anos, conforme prevê o novo regulamento. "Uma leva de liminares concedeu essa prorrogação, mas agora já caminha-se para uma unificação em sentido contrário", diz. "O entendimento de que não é cabível essa extensão diminui o número de processos e consolida a lei", diz.



A indústria farmacêutica estima em mais de R$ 1 bilhão o valor em disputa nos tribunais brasileiros. A cifra equivale ao que as empresas deixariam de lucrar caso os prazos finais das patentes fossem confirmados.



Fonte: DCI