quarta-feira, 20 de abril de 2011
EUA querem controlar uso abusivo de analgésicos
O governo de Barack Obama anunciou na terça-feira que vai procurar implementar uma legislação que exija que os médicos recebam formação especial antes de terem permissão para prescreverem poderosos analgésicos como o OxyContin®. Esta é a medida mais agressiva já anunciada pelas autoridades federais norte-americanas no sentido de controlar a utilização e o uso abusivo desse tipo de medicamento, avança o portal UOL Notícias.
Nos últimos dez anos, o uso abusivo de analgésicos como o OxyContin® continuou a atingir patamares epidémicos, e os especialistas em saúde manifestaram preocupação quanto à possibilidade de que o uso legítimo dessas drogas também represente riscos para os doentes. Durante anos tem havido uma intensa discussão no sentido de determinar se os médicos deveriam receber formação para que pudessem receitar esses medicamentos.
Os defensores da formação argumentam que tal medida não só ajudaria os médicos a melhor identificar os doentes que se beneficiariam do tratamento com narcóticos de acção prolongada, mas também os auxiliaria a desmascarar aqueles pacientes que fingem sentir dor para obterem drogas para uso abusivo. Os oponentes da medida alegam que a exigência de formação reduzirá o número de médicos que prescrevem analgésicos e prejudicará o atendimento aos doentes.
Tal medida provavelmente necessitaria da aprovação do Congresso a uma emenda à Lei de Substâncias Controladas, com o objectivo de exigir que os médicos passassem por formação como condição para a renovação das licenças emitidas pela Administração de Repressão ao Uso de Drogas para a prescrição de narcóticos.
Actualmente, a lei dá à Administração de Repressão ao Uso de Drogas autoridade para aprovar licenças se um médico simplesmente apresentar uma licença válida para a prática da medicina. Autoridades federais anunciaram a iniciativa na terça-feira, e também outras medidas que esperam que venham a reduzir o uso abusivo daquelas drogas que só podem ser vendidas mediante a apresentação de receita médica.
“A Casa Branca está totalmente determinada a instituir uma legislação que torne obrigatória a educação para a prescrição dessas drogas”, disse durante uma entrevista R. Gil Kerlikowske, o principal assessor do presidente Barack Obama para políticas relativas a drogas. “Entre todas as coisas que estamos a propor, esta é sem dúvida realmente a mais importante”, diz.
Kerlikowske disse que o seu departamento já entrou em contacto com vários parlamentares para discutir a legislação e que pretende ajudar a redigir o texto da nova lei. O responsável admitiu não saber quando a proposta será apresentada, mas disse esperar que os parlamentares que a apoiam façam isso até o final deste ano.
Reacções à iniciativa
Qualquer proposta provavelmente será combatida pelos fabricantes de medicamentos, alguns médicos e grupos de doentes, que têm argumentado que a formação dos médicos deve ser voluntária, e não obrigatória. Além disso, o projecto de lei proposto provavelmente esbarrará na oposição de alguns parlamentares que já fizeram campanhas contra aquilo que consideram ser um excesso de regulamentação da indústria da saúde do país.
Algumas das drogas que provavelmente ficariam sujeitas a um processo mais rígido de licenciamento são o OxyContin®, o fentanil e a metadona. Esses medicamentos são considerados fundamentais para o tratamento da dor. Mas, nos últimos anos, também têm sido vinculados a uma epidemia de uso abusivo e de vício em drogas vendidas mediante a apresentação de receita médica, bem como a milhares de mortes provocadas por overdoses. OxyContin® é o nome comercial de uma forma de acção prolongada da droga oxicodona.
A medida do governo surgiu depois de um painel de especialistas criado pela FDA (entidade que regula os medicamentos nos EUA) ter rejeitado terminantemente, no ano passado, a proposta para que a formação dos médicos fosse voluntária. Esses especialistas disseram que é necessário a formação obrigatória.
A FDA argumenta há muito tempo que somente o Congresso possui a autoridade para impor a formação obrigatória dos médicos como condição para que estes possam prescrever narcóticos. Isso porque a distribuição legal de drogas é regulamentada pela Lei de Substâncias Controladas de 1970, e o licenciamento dos médicos para prescreverem essas drogas é fiscalizado pela Administração de Repressão ao Uso de Drogas, e não pela FDA.
Paralelamente a isso, a FDA divulgou na terça-feira novas regulamentações que exigirão que os fabricantes de analgésicos de longa duração ou de liberação prolongada das suas substâncias activas forneçam formação aos médicos, mas que não obrigarão os médicos a fazerem tais cursos. Essa proposta é similar a outra que foi rejeitada, por ser considerada muito fraca, durante o debate sobre essa questão no ano passado. Janet Woodcock, a directora do Centro para Avaliação e Pesquisa de Drogas da FDA indicou que as regras da nova agência são de facto uma medida provisória até que a nova legislação seja aprovada e que serão utilizadas caso uma legislação relevante venha a fracassar.
Em resposta a uma pergunta dos jornalistas, a responsável disse que autoridades da FDA, da Administração de Repressão ao Uso de Drogas e de outras agências federais concordaram com a exigência de formação obrigatória para os médicos.
Kerlikowske, a autoridade mais graduada da Casa Branca no sector de repressão às drogas, disse que procurou a opinião de médicos, de faculdades de medicina e de representantes da indústria farmacêutica, que segundo ele pagariam pela formação. Esse formação seria concentrada nos analgésicos opiáceos como o OxyContin® porque são estes os que são utilizados de forma mais abusivas, além de constituírem uma perigosa categoria de drogas prescritas pelos médicos, disse.
“Neste momento, é aí que se concentra o ímpeto e a preocupação pública”, afirmou Kerlikowske. “Não queremos ser acusados de tomar medidas em relação a um número excessivo de categorias de remédios”.
Durante a revisão conduzida pela FDA, alguns fabricantes de medicamentos se opuseram vigorosamente à formação obrigatória dos médicos. Mas um executivo de uma indústria farmacêutica, a Covidien, que vende o analgésico fentanil, disse que a sua companhia apoia tal exigência.
“A emenda proposta à Lei de Substâncias Controladas, dando à Administração de Repressão ao Uso de Drogas autoridade para exigir a formação dos médicos que fornecem receitas será uma medida importante”, disse o executivo da empresa, Herbert Neuman. Cerca de 600 mil médicos, dentistas e assistentes de médicos estão licenciados pela Administração de Repressão ao Uso de Drogas para prescreverem substâncias controladas, segundo o escritório de Kerlikowske.
“Eles não recebem na sua formação muita informação sobre controlo da dor, vício, tolerância e dependência”, disse Kerlikowske.
Várias outras propostas de leis parlamentares que estão pendentes têm como objectivo coibir o uso abusivo de medicamentos vendidos mediante a apresentação de receita médica. Uma dessas propostas, apresentada pela deputada Mary Bono Mack, uma republicana pelo Estado da Califórnia, faria com que a FDA limitasse a aprovação do OxyContin® e de outras formas de liberação controlada da oxicodona aos casos de tratamento de dores graves.